User Centricity e a Jornada do usuário: por que isso é tão importante?

Ana Paula Lafuente
11 min readMar 6, 2021

Resumo: Você deseja alavancar seu produto ou serviço, escalar seus resultados e dar um próximo passo na construção de relacionamentos duradouros, saudáveis e de valor com seus clientes e consumidores? Isso só será possível se você tiver uma visão centrada no usuário!

A adoção de uma mentalidade e prática verdadeiramente USER CENTRICITY se tornou imprescindível na visão, operação e modus operandi de qualquer empresa que de fato deseja isto.

Nos meus últimos textos sobre Design de Serviços e UX x CX venho discutindo bastante este conceito que vem se tornando o ponto chave de vantagem competitiva na medida que as empresas querem mudar a forma como elas vem fazendo negócio.

Por isso decidi escrever este artigo para explicar um pouquinho mas como podemos dar um pontapé na construção da jornada do nosso usuário e como utilizá-la para de fato construir produtos que resolvam problemas e atendam necessidades reais dos nossos clientes.

Se ficou interessado, continue a leitura para entender mais sobre o que quero dizer!

Bom, ao fim e ao cabo, o princípio de “user centricity” envolve:

  • Entender o cliente sob dimensões culturais, crenças e percepções;
  • Levar em consideração expectativas e anseios do cliente em relação ao serviço;
  • Considera o contexto de uso do cliente, sempre.

Como isso, uma das ferramentas mais usadas de UX para descobrir, documentar e compartilhar o retrato do que o usuário quer com o nosso produto é a Jornada do Usuário, ou como você pode encontrar por aí em inglês “Customer Journey Map”.

A Jornada do Usuário nada mais é do que o uso de um método qualitativo para a construção e visualização de uma narrativa do usuário final tentando completar uma tarefa específica ou meta ligada a sua empresa.

Ela é de fato uma timeline (linha do tempo) que compila uma série de ações e é complementada pelos pensamentos e emoções do usuário para criar essa narrativa.

Como falei, os mapas de jornada de usuário são feitos com o uso de um método qualitativo de pesquisa para coleta destes comportamentos, ações, pensamentos e sentimentos do usuário. Você pode fazer por exemplo uma pesquisa em profundidade com vários atores, usuários, prospects do seu produto para definir a(s) sua(s) persona(s). Mas também tem vários outros métodos de pesquisa que podem ser utilizados se você for mais familiarizado com este assunto.

O que é importante dizer é que a persona e jornada precisam ser feitas pelo ponto de vista do consumidor, por isso a importância da pesquisa e por isso a forte de uma jornada é sempre o storytelling por trás.

Cada empresa vai ter a sua e irá variar se você tiver como um usuário final uma empresa (B2B) ou uma pessoa física (B2C). Também há vários e vários modelos por aí de jornada e você deve encontrar aquele que melhor se adequa ao seu modelo de negócio e produto/serviço.

No entanto, em sua maioria eles são compostos por 5 elementos:

  1. Ator: É a estrela principal da jornada. O seu cliente final. A pessoa que de fato experiencia a jornada e em geral está alinhado com a sua persona.
  2. Scenario + Expectativas: Você deve ter em mente, ao construir a sua jornada, qual é a meta, o que a sua persona está tentando atingir. Entenda onde essa história ocorre; o que ela espera ganhar atingindo ou completando essa tarefa (ou seja, qual é o job to be done do seu cliente com o seu produto?); e qual o seu goal e sua motivação por trás de estar tomando aquela ação.
  3. Fases: As fases da sua jornada vão depender só da sua empresa e do processo de compra e uso do seu produto.
Retirado do curso “Consumer Insights & UX” da Alumni Coppead.

Por exemplo um ecommerce, suas fases em geral circundam em torno da descoberta, teste, compra, uso e suporte/pós compra. Já a de uma empresa B2B podem variar entre a compra, adoação, retenção, expansão e “advocacy”.

Você deve entender por quais fases o seu cliente passa para ter e usar o seu produto ou serviço.

4. Ações, Mindset e Emoções: Esses pontos são mapeados em cada fase da jornada da sua persona.

As ações são comportamentos e passos tomados. Uma narrativa dos passos do seu usuário/ator durante cada fase;

O mindset representa os pensamentos, questões, motivações e necessidades de informação dos diferentes estágios;

As emoções são representadas em uma jornada emocional na sua jornada. Representa os “ups” e “downs” durante a experiência. Uma camada contextual que nos diz como o usuário (e o quanto) ele está prazeroso/delighted e/ou frustrado com a experiência.

5. Oportunidades: Este 5º ponto são as oportunidades que você pode ter ao construir a jornada do seu usuário e isso vamos falar mais a fundo no tópico mais abaixo “Analise a sua jornada”.

Agora, veja alguns exemplos de jornada para sua inspiração:

Jornada indicada pela Nielsen Norman Group. Veja mais aqui.
Jornada indicada pela IDC. Veja mais aqui.
Veja mais aqui.

Os benefícios da construção e uso de uma jornada do usuário são inúmeros para a empresa. Dentre eles posso destacar (1) o alinhamento maior entre a equipe que a jornada proporciona. Todos passam a ter a mesma linha de pensamento, adquirindo empatia pelo seus usuários e tendo sua experiência e nos caminhos para melhorá-la como ponto focal do seu trabalho; e (2) a jornada vira a base para tomada de decisão estratégica e de entendimento do seu usuário para a empresa como um todo, não só os que foram envolvidos na sua construção e estudo.

Jornada do usuário é o mesmo que Blueprint e User Stories?

A Jornada de Usuário é diferente do Blueprint de serviços (que também falamos no texto sobre Design de Serviços). Este último é considerado uma extensão do mapa da jornada, mas ao invés de focar no usuário (e seus pontos de vista) como a jornada, é focada no negócio, na entrega do serviço/produto em si e feito sob a perspectiva da empresa. Veja um exemplo:

Blueprint indicada pela IDC

Já o User Stories também não pode ser considerado jornada do usuário. Na verdade este é só um método usado na metodologia Agile para planejar funcionalidades e features. O formato é: “As a [type of user]; I want to [goal], so that [benefit]”.

Analise a sua jornada

Você não está tendo este trabalho de construção de jornada para deixar isso guardado na gaveta, não é mesmo?

Entenda as principais lições (takeaways) que você pode tirar da sua jornada:

Diversos insights podem surgir não só durante a pesquisa e construção desta jornada como depois, ao analisar os pain points do seu consumidor ao longo da jornada e entender como você pode melhorar a experiência do seu usuário, otimizando-a e deixando-a mais inteligente e fluída.

Entenda que a Jornada do Usuário conta a história das experiências de clientes com a marca passando por todos os pontos de contato. Agora estes pontos de contato podem ser ativos ou reativos, intencionais ou não intencionais, físicos ou online….

Comece pela (1) priorização dos seus pontos de contato: Quais são os pontos de contato cruciais para o consumidor em sua jornada? E aqueles que o seu cliente mais valoriza? Quais são as oportunidades para a sua empresa nestes pontos?

(2) Mobilização das Dimensões da Experiência: Segundo o curso recente que fiz na Coppead (que já comentei em outros textos) este conceito veio de Braskus, Schimitt & Zaratonello (2009) e discute a divisão da experiência de uma forma 100% conectada. Propuseram uma escala que inclui quatro dimensões: sensorial, afetiva, intelectual e comportamental.

Em seu estudo, os autores mostram que a ideia de experiência (de marca) se distingue de outros conceitos relacionados ao comportamento do consumidor com a marca, tais como avaliação de marca, envolvimento com a marca, apego à marca, satisfação e personalidade de marca.

Estas dimensões levam em consideração a experiência do seu consumidor e a entrega de valor como ponto central deste ciranda.

Retirado do curso “Consumer Insights & UX” da Alumni Coppead

Você deve acionar estas dimensões da experiência nos pontos de contato para que a experiência seja SINGULAR, AGRADÁVEL, EFICAZ E MEMORÁVEL.

(3) Facilite a experiência: Escolha quais os pontos e objetivos de facilitação da experiência do seu cliente deveriam ser prioritários para a empresa.

(4) Analise o branding ao longo da jornada: Há coesão temática (temática da marca) e consistência entre os pontos de contato? A marca está coerente com o que fala em todos os pontos de contato? Existem pontos de melhoria?

(5) Identifique as alianças potenciais: Que outras marcas ou categorias de consumo apareceram no relato do seu consumidor (relacionadas à experiência em questão)?

(6) Métrica e dados: Que métricas e informações deveriam existir na empresa para garantir uma boa experiência a partir do que o cliente valoriza nas etapas da jornada?

Pense sempre em pontos como:

  • O que pode e deve ser feito com este conhecimento a partir de agora?;
  • Onde estão as maiores oportunidades?
  • Quem é o responsável pelas mudanças?;
  • Como iremos mensurar as melhorias que complementaremos?;
  • Quais serão os ganhos financeiros das mudanças?

No final do dia a jornada do usuário é um processo que promove uma visão holística da experiência do usuário (com os diversos pontos de contato entre cliente-produto), descobrindo seus momentos de prazer e frustração através de uma série de interações e revelando assim oportunidades e insights para melhorar a experiência.

BÔNUS — Caminhos de compra e uso: outros estudos e conceitos

Nos estudos sobre marketing, design e ux encontramos diversas outras teorias sobre caminhos que o nosso consumidor pode percorrer no que tange a compra e uso do nosso produto/serviço.

Vou descrever brevemente alguns que considero ser mais importante conhecermos e termos em mente:

1- 5A’s

O Philip Kotler em seu livro Marketing 4.0 destaca o avanço do modelo de 4A’s para o de 5A’s na nova era da conectividade.

O modelo de 4A’s (Assimilação, Atitude, Ação, e Ação nova — recompra) era bem similar a um funil e quase uma modificação do antigo modelo AIDA (atenção, interesse, desejo, ação). Os 4A ‘s eram usados para explicar o rastreamento do comportamento de clientes e medir a sua retenção.

No entanto, com a era da conectividade o novo caminho do consumidor deveria refletir o surgimento da influência social — refletindo a ideia de que decisões pessoas são essencialmente decisões sociais. Desta forma, para o Kotler, o caminho do consumidor na conectividade consiste em 5A’s:

Assimilação: tomada de consciência da necessidade;

Atração: marcas memoráveis tem chances de estarem no topo;

Arguição: avaliação das possibilidades, pedindo conselhos a amigos ou sozinho;

Ação: compra;

Apologia: fidelidade à marca.

Neste último A de Apologia tem-se um ponto importante a se destacar: antigamente a fidelidade à uma marca era definida apenas como recompra. Hoje não mais, fidelidade e apologia à uma marca é na verdade definida de acordo com a disposição do seu usuário para defender a sua marca. Agora os clientes se conectam entre si desenvolvendo relacionamentos de pesquisar e defender.

O que o Kotler destaca em seu livro é que há uma Zona POE de influência de compra — ou seja, que conduz o seu usuário da assimilação à apologia.

Essa zona é composta pela:

Influência Própria + Influência dos Outros + Influência Externa.

Essas são entrelaçadas e podem atingir cada consumidor em proporções diferentes, no entanto todos, NECESSARIAMENTE são influenciados por esses 3 tipos.

Os novos clientes/compradores estreantes por exemplo podem passar por todos os 5A’s e contam muito com a influência externa. Por isso, podem acabar comprando a marca mais popular do segmento ou a que tem maior participação de propaganda (share of voice);

Já consumidores mais antigos do seu segmento ou produto — aqueles mais experientes — tem a sua influência própria bem mais forte, composto pelas suas experiências passadas.

O papel do profissional do marketing é então ser capaz de identificar a importância de cada influência no processo de compra do seu consumidor (ou do seu segmento) e conseguir fazer adaptações, se conectando com o seu usuário e se concentrando mais em determinadas atividades mais importantes para aqueles modelos de influência.

Um ponto importante é que este novo caminho não é necessariamente um funil fixo de clientes e eles não passam necessariamente pelos 5A’s. Pode ser um caminho em espiral, por exemplo, em que seu cliente vai e volta através dos estágios.

2- Lopp da Lealdade

Já a famosa empresa de consultoria McKinsey indica em seu texto “O novo campo de batalha para o crescimento liderado pelo marketing” a existência de um Loop da Lealdade.

Esse loop traz conceitos bastante comportamentais do processo de compra (você compra porque gosta da marca e/ou aquela experiência te marcou), mas também conceitos atitudinais (você compra porque tem uma atitude fiel e positiva em relação aquela marca mesmo sem nunca ter comprado ou usado seu produto antes).

Imagem retirada do site da McKinsey .Veja mais aqui.

O loop então começa a partir de um (1) trigger/gatilho em que o consumidor se vê com uma lista de marcas, é exposto a várias percepções e se vê em contato por vários touch points com as mesmas;

A partir disso há uma avaliação ativa (2), o consumidor avalia as marcas que tem em mão e acha que quer e chega enfim ao momento da compra/purchase (3)m em que escolhe a marca que mais se identifica.

A última etapa do loop é a etapa do pós-compra. Segundo a consultoria, todo esse processo constrói o relacionamento marca-cliente e faz com o último entre em um “ciclo da fidelidade” — voltando a compra da marca sem nem mesmo buscar outras opções.

3- Outros Funis de Marketing

Muito parecido com estes conceitos também podemos associar alguns funis de marketing e vendas que sempre vemos por aí, como:

Mas funil é jornada? NÃO!

Apesar dos dois terem uma cisão de processo, o principal ponto que os diferencia está relacionado a perspectiva pela qual são construídos. A Jornada do Usuário como já vimos antes é feita com base no ponto de vista e perspectiva do CLIENTE. Já um Funil de Marketing é construído com base na perspectiva da EMPRESA. Ele representa o planejamento e estratégia da empresa — e seu objetivo — para atrair e se comunicar com o cliente. Ou seja, tem zero contexto de vida do consumidor por exemplo, diferentemente da jornada do usuário.

Além disto, considero que estes funis tradicionais apresentam algumas falhas como: levam em conta por exemplo apenas as conversões, mas não fala de crescimento em si da empresa; não deixam claro as ações realizadas por um visitante ou lead para não avançar de estágio ou completar uma conversão; e também focam muito no time e ações de marketing e vendas apenas, não permitindo visualizarmos a importância da atuação de outras áreas como produto, design, financeiro, CX e outros.

Se quiser saber mais sobre essas diferenças recomendo ler este artigo de 5 minutos da Catia Moreira — Phd & Consumer Insights Researcher — com quem tive o prazer de ter tido aula no curso que mencionei no início deste capítulo.

Espero que tenham gostado. Até a próxima!

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Ana Paula Lafuente

Carioca e libriana, sou apaixonada por GENTE! Amo contar histórias e escrever sobre comportamento, branding, negócios, produto, e claro, muito marketing. 🌻